Em entrevista à Gazeta do Povo, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, destaca a postura da pasta quanto a temas como previdência rural, demarcação de terras, Nova Lei dos Agrotóxicos e Funrural
Nas eleições de 2018, Jair Bolsonaro (PSL) era bem visto pelo setor agropecuário. Então deputada federal e presidente da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), Tereza Cristina (DEM-MS) foi à casa do atual presidente formalizar o apoio da bancada ao então candidato. Reeleita, aceitou coordenar o ministério da Agricultura.
Em sua primeira visita a uma grande feira agropecuária como ministra, no último dia 8, ela teve agenda na Show Rural, em Cascavel. “Já fui uma vez como produtora, quando era secretária de Estado do Mato Grosso do Sul. É uma feira especial, já que vem gente de todo o Brasil e também de fora do país para a feira”, disse a ministra, em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo.
Sem adiantar projetos prioritários para a pasta — o governo “tem que se reestruturar, ao mesmo tempo em que não pode parar” — a ministra comentou sobre os principais temas que devem envolver a agricultura no próximo período. Entre eles a nova Lei dos Agrotóxicos, a negociação do passivo do Funrural e a quebra da safra. Além de comentar sobre o relacionamento com o ministro Ricardo Salles, do Meio Ambiente (a possibilidade de fusão dos dois ministérios foi ventilada durante a transição do governo, e recebeu críticas).
Na ‘bagagem’, Cristina traz alguns de seus secretários de política agrícola e tem reunião marcada com o governador do Paraná, Ratinho Junior (PSD). Engenheira agrônoma, Tereza Cristina assumiu a presidência da FPA no primeiro mandato de deputada federal, após ser eleita em 2014. Agora, como ministra, explica a postura do Ministério da Agricultura sobre temas que afetam o agronegócio quanto e frentes, como a ambiental e indígena.
Gazeta do Povo – O ministro da economia tem a prioridade da Previdência. Moro tem o pacote anticrime. E a agricultura: qual é a grande prioridade deste início de mandato?
Tereza Cristina – Já liberamos as DAPs [Declaração de Aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar] para os próximos dois anos, para ajudar o pequeno agricultor, pois seria muito complicado para o governo ter que refazer todas as DAPs. Isso já foi implementado. Agora vamos entregar ao congresso o Sisbi [Sistema Brasileiro de Inspeção de Produtos de Origem Animal], que é a liberação [e padronização] do comércio de alimentos entre todos os estados.
GP – A previdência dos produtores e trabalhadores rurais é diferente da cidade, e deve fazer parte da Reforma da Previdência. A senhora já conversou sobre esse tema com o ministro da Economia, Paulo Guedes?
TC – Ainda não conversei e, inclusive, tenho que marcar uma agenda. O texto está sendo construído e acabou vazando um que não sei se é o definitivo.
GP – Essa é uma questão polêmica que inclui o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural, o Funrural. Antes, o produtor deveria recolher 2,1% para a previdência sobre tudo o que vendesse, e as empresas 2,6%. Em 2010, a contribuição foi suspensa pelo STF para um frigorífico, o Mataboi, e abriu o precedente do não recolhimento. Em 2017, mudou o entendimento e os produtores rurais passaram a ser devedores do período não contribuído. Agora, eles não querem pagar esse passivo. Inclusive, em 2018 as porcentagens do Funrural foram revistas. Qual é o posicionamento do novo governo sobre o tema?
TC – Realmente o problema do Funrural precisa ser definido. O presidente Bolsonaro disse que quer buscar uma resolução, e a boa notícia foi a recente opção do pagamento pela folha [de pagamento de funcionários], e que já está valendo. Só que os produtores precisam dizer qual opção preferem para migrar [o modelo de contribuição]. E quanto ao passado, é preciso encontrar uma maneira legal. O governo deve estar estudando isso para ver como o presidente vai fazer para cumprir essa remissão.
GP - O passivo chega a R$ 17 bilhões. O governo pretende abrir mão desse valor?
TC – É uma coisa que o presidente quer fazer, mas o governo precisa achar a legalidade disso. Ele não pode incorrer em Lei de Responsabilidade Fiscal. O governo acabou de assumir, mas como é um tema caro ao presidente, então está sendo discutido para ver a maneira legal de ser colocado. Porque é uma renúncia [fiscal]. O presidente só vai assinar se tiver o ‘ok’ da parte jurídica do governo.
GP - Nessas avaliações que estão sendo feitas, já se pensa na elaboração de alguma Medida Provisória?
TC – Ainda não. Você tem que entender que temos 30 e poucos dias de governo, tirando os finais de semana (risos). E como tivemos, primeiro, a reestruturação de todos os ministérios, com várias fusões, e é preciso refazer essas estruturas. A Economia é um que incorporou Planejamento, INSS, enfim, uma série de coisas. Ficou um superministério. Você tem que entender que o governo tem que andar, mas também tem que se reestruturar, ao mesmo tempo em que não pode parar. Existem temas mais urgentes e outros temas com urgência média que estão sendo elaborados para ‘daqui a pouco’, até porque o Congresso reabriu nesta semana. Então, essa é uma pauta que com certeza terá que ir para votação na Câmara e no Senado.
GP – Sobre a reestruturação de ministérios, a atribuição de demarcação de terras indígenas passou da Funai para a pasta da Agricultura. Isso foi, inclusive, motivo de críticas de alguns setores. Por que foi tomada essa decisão?
TC – É simplesmente uma visão administrativa para juntar coisas que tem a ver uma com a outra, todas em uma mesma pasta. Aqui nós juntamos todas as agriculturas: o assentamento [de terras], que estava no Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária); a agricultura familiar, que estava na Sead (Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário), e a agricultura que estava no Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). Isso tudo ficou em um único ministério.
GP – Chegou-se a cogitar a união dos ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente, o que não ocorreu. Mas a senhora chegou a comentar que essa pasta teria um nome em comum acordo, com o seu crivo. A escolha do Ricardo Salles realmente foi conjunta entre a senhora e o presidente?
TC - Foi uma escolha do presidente, mas tivemos uma conversa de harmonia das ações. Eu tenho uma convivência muito boa com o ministro Ricardo Salles. A gente troca ideias e conversa para melhorar os processos. E simplificar processos não quer dizer que vamos perder ou tirar a segurança. Muito pelo contrário: você vai dar agilidade mantendo a segurança. É a mesma coisa do setor fundiário: as leis estão aí para serem cumpridas. No meio ambiente, existe o Código Florestal, que é um dos melhores do mundo – se não for o melhor –, com competências muito claras do que tem ser seguido. O que temos de quebrar é a maneira ideológica de fazer esses processos. Isso tem que ser técnico. E é isso que tenho conversado muito frequentemente com o ministro Ricardo Salles, que é muito competente…Temos de quebrar é a maneira ideológica de fazer esses processos [entre Agricultura e Meio Ambiente]. Isso tem que ser técnico. E é isso que tenho conversado muito frequentemente com o ministro Ricardo Salles, que é muito competente
GP - A questão da agilidade também é uma bandeira da Nova Lei dos Agrotóxicos. Ela já passou na comissão de Agricultura na Câmara. Qual é o nível de prioridade da aprovação desta lei e como isso está sendo negociado com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia?
TC – Agora essa não é mais uma atribuição minha: é uma atribuição dos parlamentares, principalmente da Frente Parlamentar Agropecuária. Mas isso (a nova lei) é bom para o Brasil e para a agricultura brasileira e não tira segurança alguma.
ENTENDA: O que propõe a Nova Lei dos Agrotóxicos
A lei nova traria governança e transparência. E como tudo caminharia mais rápido, teríamos mais moléculas novas sendo registradas, sem precisar das moléculas antigas, que poderiam ir para a prateleira ou, até mesmo, serem banidas. Mas agora quem deve estar discutindo a aprovação é o novo presidente da FPA, o deputado Alceu Moreira (MDB-RS). Ele, com outros deputados da Frente, vão fazer essa discussão da importância para colocar isso em votação. Eu acho que tinha que colocar, mas essa é uma decisão do Congresso.
GP - A safra está complicada e as perdas já são realidade no Paraná e no Mato Grosso do Sul, seu estado, onde já se estima quebra de 15%. O governo pode fazer algo para ajudar os produtores que ficaram no prejuízo?
TC - O que tem dificultado esse debate é que as perdas são muito pontuais. Ela é grande se olhar o percentual, mas ainda assim é pontual. Em uma fazenda, uma ao lado da outra, temos uma colhendo muito e a outra colhendo pouco. Então, é difícil achar medidas coletivas. Na média não devemos diminuir muito o tamanho da safra. Mas a gente sabe das agruras de produtores que tiveram perdas significativas, principalmente no Paraná e no Mato Grosso do Sul, e também estamos acompanhando de perto o Matopiba, onde a colheita é mais tardia. Temos conversado com o Banco do Brasil. Eles têm colocado que, aqueles produtores que têm o seguro rural, vêm acionando. Mas precisam acontecer conversas individuais porque não pode prorrogar o prazo [de pagamentos de crédito] de um município específico. O que tenho conversado com o vice-presidente de agronegócio do banco [Ivandré Montiel da Silva] é que os municípios com mais problemas, principalmente aqueles que já decretaram emergência, estão procurando o banco e fazendo suas renegociações individualmente.
GP – Por falar em safra, a Tabela do Frete afeta diretamente o transporte da produção. Como o Ministério da Agricultura enxerga essa questão?
TC – Quem está capitaneando essa discussão é o ministro Tarcísio [Freitas, da Infraestrutura]. Ele tem conversado com os caminhoneiros. Eu já participei de algumas reuniões, mas ele é que tem tratado disso porque cabe à pasta dele. Essa tabela é ruim e ajudou pouca gente por ter vários defeitos. Em uma economia aberta, como a nossa, fazer um tabelamento é complicado. A tabela foi refeita somente com o aumento IPCA, e alguns nichos de transporte tiveram forte aumento do custo. Isso transfere tudo para consumidor final. Quem paga a conta sempre são as pontas mais fracas: o produtor que está arcando com frete mais caro, e o consumidor que vai receber o aumento desse custo na ponta.
Eu acho que devemos encaminhar para uma solução definitiva, e o ministro Tarcísio deve ter uma reunião em junho, para avaliar uma tabela que está sendo feita com a USP Luiz de Queiroz (Escola de Agricultura da Universidade de São Paulo), que tem um modelo matemático para melhorar essas variáveis que tem prejudicado alguns setores.
GP - Para finalizar, há a questão do comércio exterior. Sempre se fala que o Brasil tem a missão de alimentar o mundo, mas está enfrentando problemas. Já houve a suspensão e depois o retorno de exportações de carne suína para a Rússia. Em janeiro, os Emirados Árabes descredenciaram frigoríficos de frango. Como o Ministério está posicionado agora, para lidar com essas situações?
TC - Conversando com todos. É um mercado de gigantes. Como o Brasil é um grande produtor de grãos, ele incomoda muita gente. E é claro que sempre vamos estar em discussões com alguns países. Mas a gente tem recebido todo mundo, e vamos começar a fazer viagens daqui a pouco, procurar esses parceiros. Nosso objetivo é, além de manter mercados, abrir novos. Porque o Brasil pode continuar produzindo e crescendo mais, mas a gente precisa desses mercados abertos para soja, milho, algodão, carne de frango, suínos, bovinos, enfim, para nossas principais commodities." Fonte:https://www.gazetadopovo.com.br/agronegocio
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